9.4.18

FORMA E ESSÊNCIA

Habituámo-nos à personagem e não à pessoa. Falta humildade e serviço, bondade e modéstia; prevalece o ego, o endeusamento da finita razão e o socialmente correcto. Vivemos amassados por tanta informação, anestesiados no poder tecnológico, no bramir do dinheiro, a angústia do futuro, e mal sabemos o que é a comunicação da alma. Ridicularizamos quem caminhe em sinal contrário, somos cordiais mas pouco autênticos, julgamos sem receios e tornamo-nos menos pessoas.
 
Falta-nos conduzir o Tempo e não de ser levados animalescamente por ele. Falta-nos soltar as palavras belas e inconfundíveis como se fossem pequenas fontes de água fresca, e não uma sucessão verborreica a imitar um esgoto que a espaços convulsos deita água suja ao mar. Falta o Encontro. Aquele em que saímos de nós para o podermos ter verdadeiramente!
Falta-nos a leveza do ser. Não estar só ao lado dos grandes ou dos fortes, do socialmente giro ou da moda. Dar muito crédito a quem já o tem, por moda ou mérito, relegando a essência dos anónimos! É aí que me revejo. Em encontrar por dentro e não por fora, em credibilizar quem é ostracizado ou fingidamente elogiado.
 
Precisamos de amor e de partilha. Verdadeiros, não sociais. De cortar silêncios e empreender caminhos. Não bajulação. Precisamos de renovar a alma e tirar o bolor racional que nos corrompe. Há muito azul por conhecer debaixo da cinza vulcânica com que maceramos os dias.
Estamos muito habituados a erguer camadas e camadas de defesas, a ser adultos e bem parecidos nas palavras, nos sítios que frequentamos, no crédito que damos e queremos ter, mas falta tanta vez a simplicidade espontânea da alma, que manda o socialite dar uma volta, e não cuida se é um gesto censurável socialmente ou se apenas aplaudimos os grandes.
 
Viver não é acumular coisas ou preencher a agenda, mas este descalçar do eu social numa partilha que cabe a cada um fazer e descobrir, não como quem passa, mas como quem escuta... e fica... Porque sem entrega e sentido de humor, simplicidade e sorriso, sem saber ser criança em adulto, desumanizamo-nos!